janeiro 06, 2012

Pegando todas

         Eu sabia que precisava me aperfeiçoar como hétero na nova escola, mas não estava nem um pouco disposto a sair ficando com mais garotas. Depois da tempestiva Bianca, eu não queria mais me submeter àquele tipo de provação. Mas como deixar claro para todos que eu não era mais um “veadinho” que chegava de outra cidade, se não mostrava serviço? E pior! Como mostrar um bom serviço, com minha parca experiência? Mais alguns saldos negativos, e o garoto tímido seria compulsoriamente tachado de gay. Tinha que fazer algo. Afinal, se havia decidido tentar ser hétero, deveria estar preparado para todas as consequências.
Minha principal meta era aperfeiçoar o beijo, a tal pegada, dominar a arte da paquera e da conquista. Mas estava claro que não podia iniciar o processo com as garotas da escola. Quando alguma de lá resolvesse chegar em mim, eu já tinha que saber como fazer. Isso me perturbou por um bom tempo. Tinha medo de que a qualquer hora uma garota surgisse e eu não estivesse pronto para assumir meu papel com propriedade. O dilema só teve fim já pertinho do ano acabar, quando entrei em contato com meu primo Lucas.
Lucas era daqueles primos que moram na mesma cidade, mas que nunca temos contato. Na realidade, a mãe dele é quem é prima legítima da minha, nós então, primos segundos. E até aquela data não tínhamos nenhuma ligação além do parentesco que nos unia. Foi minha mãe quem nos aproximou. Lucas era engraçado. Nas poucas vezes que o vi na escola, quando era criança, eu o considerava um garoto tímido e muito na sua. De fato, ele ainda o era, mas ao mesmo tempo, revelava um lado tão descontraído que parecia outra pessoa. Além disso, seu andar era cômico, como se a cada passo só pudesse mexer do joelho para baixo.
Embora eu passasse a semana inteira na casa da minha tia, na cidade vizinha, todos os fins de semana eu estava em casa. E foi exatamente aí que Lucas entrou. A princípio, nos encontrávamos à noite, no lugar mais badalado da cidade, a igreja. Não, não era uma juventude adepta à religião. Mas lá, enquanto a missa acontecia, a molecada se reunia no patamar para fofocar. Ir à missa era uma tradição na minha família. Quando era menor, costumava ir aos domingos pela manhã. Depois que cresci, o sábado à noite era a opção mais adequada. Eu até que acompanhava direitinho dentro da igreja, sentado nos últimos bancos, mas depois que Lucas apareceu, eu descobri por que a missa do sábado era tão atraente à moçada.
Foi lá que Lucas traçou os primeiros passos para o que viria a ser meu treinamento na arte de “ficar”. Logo éramos dois garotos solteiros à procura da caça. Eu realmente queria ganhar mais experiência, mas no fundo, sentia que não seria uma boa ideia voltar a me envolver com garotas. Já estava no fim do ano na escola e nenhuma outra garota havia se interessado por mim. De certo modo, eu já estava me acostumando a não ter ninguém no meu pé e não ter que fingir nada para ninguém. Mas quando Lucas arranjou os primeiros encontros, não tive como dizer não, diante da sede incontrolada dele pelo sexo oposto. Se eu me negasse a ficar com uma menina, seria no mínimo estranho.
E assim voltei a explorar o universo feminino. Primeiro uma, depois outra. E outra. Mais outra. A cada fim de semana, uma garota diferente que nunca tinha visto cruzava meu caminho. Para Lucas aquilo era a festa. Para mim, um pesadelo. Minha fama na cidade já estava começando a correr solta. Recordo-me de escutar de umas garotas, enquanto beijava outra numa esquina: – “Olha! Ele não é gay”. Até minha mãe começou a se preocupar com essa minha fase “galinha”. – “Um menino tão bonitinho como você não precisa ficar saindo assim com uma e outra. Arranje uma namorada”. Foi com essa desculpa que pus fim nas saídas com Lucas. Acabou sendo mais fácil do que imaginava. Apenas disse que não estava mais a fim e ele entendeu perfeitamente. Na verdade, tudo era sempre mais simples quando se dizia a verdade. Eu só não havia compreendido ainda.
Com o fim do primeiro ano do ensino médio e as experiências com mulheres que tive ao longo dele, consegui me sentir mais seguro, mais preparado para encarar o mundo. Parece que a máscara hétero estava funcionando. Não era a minha realidade, mas naquele momento me pareceu a saída mais funcional para levar a vida. Por mais que alguém pudesse desconfiar da minha sexualidade, a camuflagem que consegui com as garotas que Lucas me arranjou naquele ano lançou uma baita dúvida no ar. Era difícil sim ter que manter aquela fachada, mas seria bem pior suportar o julgamento de todos. Até aquele momento eu acreditava que todo gay era necessariamente efeminado, inclusive eu, e isso eu não queria de maneira alguma. "Tem que controlar esses trejeitos, engrossar a voz e entrar no grupo". Esse era o pensamento. O difícil mesmo era enfrentar as novas provas pelo caminho. E elas sempre viam. Antes do ano acabar, estava eu com minha terceira namorada oficial.

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